'Ecochatices' de James Cameron podem render bons frutos no futuro
Muito já se falou dos efeitos especiais de ponta, do orçamento multimilionário jamais antes visto na história do cinema e da suposta missão de "Avatar" em consolidar de uma vez por todas a tecnologia 3D nas salas de cinema de todo o mundo.
A maioria dos textos nesse sentido, no entanto, têm deixado de lado o argumento do novo filme de James Cameron, o primeiro depois de 12 anos do "Titanic", que tem pré-estreia mundial na noite desta quinta-feira (17) e entra em circuito em centenas de salas do país no dia seguinte.
O longa-metragem (de cerca de 2 horas e 40 minutos de duração) conta a história de um ex-soldado que perdeu o movimento das pernas em combate e se alista para ocupar o lugar do irmão em um projeto de exploração de um planeta distante chamado Pandora.
Em tempos de guerras no Iraque e no Afeganistão, o drama de Jake Sully (Sam Worhtington) está longe de ser ficção. Dê um giro pelas ruas dos Estados Unidos, hoje, e não será difícil encontrar jovens de 20 e poucos, 30 anos, com físico de atleta mas metidos para sempre em uma cadeira de rodas graças a algum acidente no Exército.
Apesar de fantástica, com suas montanhas que flutuam no ar e criaturas coloridas que lembram uma mistura dos dinossauros de "Jurassic Park" com panteras, macacos e rinocerontes da fauna contemporânea, Pandora é bem parecida com o nosso planeta Terra - em especial com as florestas tropicais da Amazônia.
Temos pouco ou nada a ver, entretanto, com os Na'vi, os gigantes antropomórficos azuis que habitam Pandora e que respeitam toda forma de vida por acreditarem que tudo na natureza é parte de uma grande rede de troca de energias.
Pois o conflito do filme se dá justamente quando uma megacorporação formada por cientistas e militares resolve deslocar os nativos de seu habitat para extrair um raríssimo minério do solo, chamado de "unobtanium" - literalmente, algo impossível de se obter.
Dentro da corporação há dois tipos de pensamento: o dos cientistas, donos de uma tecnologia capaz de projetar suas consciências para dentro de corpos clonados dos Na'vi (os tais avatares) para poder se misturar ao ambiente e entender seu funcionamento; e o dos investidores capitalistas e militares, dispostos a lançar mão de qualquer artifício (leia-se: armas e bombardeio pesado) para abrir caminho à extração do minério.
"Quando alguém se coloca entre você e aquilo que você deseja muito, este alguém passa a ser seu inimigo", ilustra um dos personagens, refletindo uma ideologia bastante parecida com a que move guerras contemporâneas no Oriente Médio. Troque "unobtanium" por petróleo e o discurso é mais ou menos o mesmo.
Não é preciso ir muito longe para imaginar qual lado é mais forte nessa balança. Em determinado ponto do filme, os humanos invadem a floresta dos Na'vi e promovem uma destruição quase total do lugar. São cenas que remetem não só às guerras mas ao desmatamento e às queimadas tão conhecidas por aqui.
É oportuno, portanto, que "Avatar" - como a animação "Wall-E", no ano passado - esteja sendo lançado em um momento em que o mundo inteiro discute mecanismos possíveis para frear o aquecimento global e a destruição do planeta.
Por mais que a história de Cameron possa estar apoiada em diversos recursos narrativos que hoje já são entendidos como clichês - o "homem mau" contra a natureza, a dificuldade de entendimento entre povos ou espécies diferentes etc. -, seria de um cinismo atroz acreditar que, por trás de toda a virtualidade de Pandora, o filme não esteja tratando de perigos bem reais e imediatos.
Levando em conta todos os esforços investidos na produção e divulgação do longa, bem como a afinidade de seu diretor para com monstros de bilheteria ("Titanic" é até hoje o filme mais rentável da história), é possível arriscar que "Avatar" se torne um novo marco no cinema.
Se para os adultos de hoje talvez tudo isso soe como pura "ecochatice", quem sabe nas crianças de amanhã suas sementes comecem a dar bons frutos.
Category: 18 de dezembro, avatar, ESTREIAS, ESTRÉIAS, Nos Cinemas
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