Crítica: 'Encarnação do demônio' é superprodução trash

boy | 10:31 | 0 comentários

Com orçamento de R$ 1,8 milhão, Mojica investe pesado em sangue e tortura.
Filme encerra trilogia do personagem Zé do Caixão, iniciada na década de 60.


Após 40 anos de hiato, o personagem mais célebre do terror nacional está de volta. Zé do Caixão, interpretado por José Mojica Marins, retorna aos cinemas nesta sexta-feira, 08/08/08, data escolhida a dedo –e unhas– pelo mestre do pânico. Volta em grande estilo, importante ressaltar, com orçamento de produção de R$ 1,8 milhão disponibilizado para que Mojica pudesse criar e comandar de acordo com suas vontades. A verba não é alta, mas para quem era acostumado a trabalhar apenas com o negativo e a colaboração do elenco, é dinheiro de superprodução.

Figuras influentes do atual cinema brasileiro se mobilizaram, dispostas a tornar realidade o maior sonho de Mojica: encerrar –dignamente– a trilogia iniciada nos anos 60 com "À meia-noite levarei sua alma" (1964) e "Esta noite encarnarei no teu cadáver" (1967). Juntaram-se Paulo Sacramento (diretor de "O prisioneiro da grade de ferro" e montador de filmes como "Amarelo manga" e "Chega de saudade"), Cássio Amarante (diretor de arte de "O ano em que meus pais saíram de férias", entre muitos outros), José Roberto Eliezer (diretor de fotografia de "O cheiro do ralo", "Se eu fosse você"), André Abujamra na trilha sonora e tantos outros que dedicaram-se a transformar "Encarnação do demônio" na superprodução trash que de fato ele é.

Pode soar contraditório, mas se não fosse trash não seria Zé do Caixão. O estilo que consagrou o gênio do terror foi preservado e atualizado –novas formas de tortura se revezam com trechos dos filmes antigos do cineasta. "Encarnação do demônio" vem sendo comentado por todo canto, ganhou prêmios no Festival Paulínia de Cinema, onde fez sua estréia, e vai para o Festival de Veneza. Mas não espere que o glamour tenha trazido escrúpulos para o protagonista. As cenas de tortura retratadas no filme são de dar pesadelo à noite, em especial aquelas em que mulheres são submetidas, das piores formas jamais imaginadas, a ratos e baratas.


Muito sangue e tortura em ''Encarnação do demônio'', filme de Zé do Caixão (Foto: Divulgação)

A história começa com a libertação do assassino da cadeia, depois de ele ter cumprido o tempo máximo permitido pela lei brasileira. Já nas ruas, é recebido pelo corcunda Bruno (Rui Rezende), seu fiel serviçal e cúmplice, que prepara tudo para a volta do criminoso.

As instalações –numa favela paulistana– continuam tendo caixões, ossadas e clima macabro. E as intenções de Zé do Caixão seguem as piores possíveis. Como nos filmes anteriores, ele ainda quer encontrar a mulher superior com quem poderá procriar e finalmente ter seu tão sonhado filho perfeito.

Para ver "Encarnação do demônio" e apreciá-lo de alguma forma, é preciso deixar alguns conceitos do lado de fora do cinema. Não espere, por exemplo, coerência nem um roteiro sem buracos. Não ache que haverá efeitos especiais ou computação gráfica. Não acredite que você verá shows de interpretação.

Sem tais expectativas, a experiência de ser assombrado por Mojica pode ser muito mais rica. Se o roteiro tem falhas, também tem o mérito de humanizar o bandido sanguinário dos anos 60, tranformando-o em um homem perturbado pelos fantasmas das próprias vítimas. Se não há efeitos de última geração, causa muito mais impacto saber que a maioria das seqüências aterrorizantes foram de fato realizadas. E se o filme conta com atores jovens e inexperientes, também tem figuras magistrais, como Milhem Cortaz, Jece Valadão, José Celso Martinez e o próprio Mojica, que com seu estilo caricato transformou Zé do Caixão em um clássico.

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